DE ONDE VEM O JEITINHO E A MALANDRAGEM QUE ALIMENTAM A CORRUPÇÃO NO BRASIL

Por estes dias me perguntaram por que Lula ainda tem muito apoio de camadas sociais, mesmo sendo demonstrados seus crimes que acabou com a Petrobrás.

Para tentar responder buscamos o auxílio dos estudos antropológicos. Segundo o Wikipédia, a antropologia é a ciência que tem como objeto o estudo sobre o homem e a humanidade de maneira totalizante, ou seja, abrangendo todas as suas dimensões.

Os estudos antropológicos apontam um conflito entre normas morais e prática social da corrupção no Brasil. Ou seja, a prática da corrupção não é em razão da ausência de aspectos morais no brasileiro, mas pela cultura política adotada a partir de 1985. A corrupção é explicada, no plano da sociedade brasileira, pelo buraco que separa os aspectos morais e a cultura política. Isso acarreta uma tolerância à corrupção que está na base da vida democrática atual do brasileiro.

Por aqui, na maioria absoluta das vezes é necessário os ingredientes do jeitinho e da malandragem para se resolver um problema, seja de cunho pessoal ou social.

Os especialistas são uníssonos ao afirmarem que a tradição política brasileira não respeita a separação entre o público e o privado. Também destacam que a corrupção é fruto da herança deixada pelos colonizadores portugueses, que confere ao Brasil um forte caráter de sociedade tradicional, onde a corrupção é prática corriqueira em função da ausência de capitalismo, em particular do mercado. Como destaca Faoro:

"Tudo acabaria - mesmo alterado o modo de concessão do comércio - em grossa corrupção, com o proveito do luxo, que uma geração malbaratara, legando à estirpe a miséria e o fumo fidalgo, avesso ao trabalho. A corte, povoada de senhores e embaixadores, torna-se o sítio preferido dos comerciantes, todos, porém, acotovelados com a chusma dos pretendentes - pretendentes de mercês econômicas, de cargos, capitanias e postos militares. (...) A expressão completa desta comédia se revela numa arte, cultivada às escondidas: a arte de furtar. A nota de crítica e de censura flui de duas direções, ao caracterizar o enriquecimento no cargo como atividade ilícita: a ética medieval, adversa à cobiça, e a ética burguesa, timidamente empenhada em entregar o comércio ao comerciante (FAORO, 2000. p. 99-100)."

Para Bonfim, o parasitismo social brasileiro e a degeneração moral são explicados pela hereditariedade do mundo ibérico, que sempre esteve associado, em sua história, à exploração do além-mar e de civilizações não-européias, e seu efeito seria o fato de a corrupção estar incrustada na sociedade, definindo um mundo cotidiano de vícios. Para o autor:

"Nos grandes, a corrupção faustosa da vida da corte, onde os reis são os primeiros a dar o exemplo do vício, da brutalidade, do adultério: Afonso VI, João V, Filipe V, Carlos IV. Nos pequenos, a corrupção hipócrita, a família do pobre vendida pela miséria aos vícios dos nobres e dos poderosos (BONFIM, 2002, p. 694)."

Estudos do Departamento de Ciência Política, Universidade Federal de Minas Gerais apontam que a tolerância à corrupção não é um desvio de caráter do brasileiro, uma propensão e culto à imoralidade, nem mesmo uma situação de cordialidade, mas uma disposição prática nascida de uma cultura em que as preferências estão circunscritas a um contexto de necessidades, representando uma estratégia de sobrevivência que ocorre pela questão material.


"A tolerância à corrupção não é uma imoralidade do brasileiro, mas uma situação prática pertencente ao cotidiano das sociedades capitalistas. A confrontação entre excelência e cotidiano cria uma antinomia entre valores e prática, tornando a corrupção um tipo de estratégia de sobrevivência, mesmo em um contexto onde a moralidade existe. Isso implica que a corrupção represente um desafio à democratização brasileira, não no plano formal, mas no plano da cultura política. Não se pode dizer, portanto, que o brasileiro típico represente um caso de ausência de virtudes. As democracias não podem confiar apenas nas virtudes dos cidadãos, uma vez que é fundamental pensar a efetividade das leis. As virtudes são necessárias, mas não representam uma condição suficiente para manter o funcionamento da democracia. É necessário pensar, porém, no caso brasileiro, um processo de democratização no plano da sociabilidade e da cultura, tendo como horizonte uma democracia que não se resuma a seus ritos formais, mas que seja capaz de garantir a adesão do cidadão comum às instituições democráticas, tendo em vista a efetividade da lei e mecanismos democráticos de controle da corrupção. O que poderia tornar a corrupção no Brasil endêmica seria a possibilidade dos valores públicos degenerarem".

Os estudiosos concluem que "a corrupção não está relacionada ao caráter do brasileiro, mas a uma construção social que permite que ela seja tolerada como prática". 

Fonte: FILGUEIRAS, Fernando. A tolerância à corrupção no Brasil: uma antinomia entre normas morais e prática social. Opinião Pública, v. 15, n. 2, p. 386-421, 2009.

Blog do Edgar Ribeiro

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